No dia 24 de janeiro do presente ano, o papa Francisco recebeu em audiência privada o sr. Diego Neria Lejarraga. Seria algo até comum pois segundo a tradição cristã qualquer católico pode solicitar uma audiência com o Santo Padre se não fosse por um pequeno detalhe: Diego é transexual. Ele vive na cidade de Plascencia, na comuna de Estremadura.
Diego Neria (à direita), transexual recebido no Vaticano |
O caso reascendeu um debate nos meios católicos, principalmente sobre como as religiões lidam com a transexualidade. A despeito do que o catolicismo fala sobre o assunto, eu procurei ir num caminho diferente: entrevistei por e-mail duas transexuais (Lirous e Fabrizia) e uma trânsgenero (Gisele), fazendo perguntas sobre o modo como elas vêem a religião. O resultado você pode conferir abaixo:
Nome: Lirous K'yo Fonseca Ávila
Idade: 32 anos
Ocupação: Estudante de Serviço Social e Coordenadora da ADEH ( Associação de Direitos Humanos com enfoque na sexualidade)
Cidade: Florianópolis-SC
Um lema de vida: "Se algo não é obviamente impossível,
então deve haver uma maneira de fazer." Nicholas Winton
1) Qual sua formação religiosa?
Eu me criei dentro da igreja
católica e sempre com muita vontade de
seguir uma possível "carreira religiosa". Expressava desde criança
quando brincava de "Missa" em casa com minhas pelúcias e bonecos de
guerra.
2) Sua
concepção de Deus é...
Não acredito em um Deus
personificado, acredito numa grande energia que nos movimenta, no fundo
acredito que todos juntos somos Deus, e que estamos todos ligados com o
universo.
3) Fale-me
experiências (sejam positivas e/ou negativas) que você teve com a religião.
A religião ao mesmo tempo que
me acolhia, me excluía, tive fases na minha vida que me deixaram um pouco
decepcionadas com as pessoas que faziam parte dela, pois sempre imaginei que
quem estava dentro da carreira, sendo padre, irmãos, e afins, deveriam ter um
grau de espiritualidade elevado e isso me foi comprovado que não.
Enquanto criança, que tinha a voz de
"castrato", eu era boa o suficiente para estar junto, mas logo que o
meu corpo começou a se modificar espontaneamente na puberdade, já não era mais
boa o suficiente para estar ao lado dos irmãos La Sallistas. Sofri com a
modificação corporal na minha puberdade quando o meu corpo começou a criar
formas sem qualquer uso de medicação e por não ter uma explicação lógica,
acabei sendo convidada a me retirar do espaço que frequentava, nesse caso a
escola.
Após isso fui conhecer outros
espaços religiosos, não necessariamente católico ou Cristão e cheguei a
conclusão que todas as religiões tem muita coisa em comum, que acreditam de
formas diferentes e que carregam com elas um pouquinho da "verdade".
Não acredito mais em uma religião absoluta que seja a dona da verdade, pois não
há.
Com o passar dos anos, os homens
corromperam muito essa verdade a favor dos seus próprios benefícios.
Acredito que a elevação espiritual é
importante indiferente da religião, desde que seja para benefício próprio
espiritual, sem ferir o outro. Todas as religiões fazem um papel importante se
o indivíduo se permitir, o problema é que no meio disso, muitos dos seus
dirigentes se aproveitam dos mais frágeis para poder viver de uma maneira mais
confortável dentro do nosso sistema capitalista, tornando grandes templos em
comércios.
4) Faça uma
análise da religião e seu papel na sociedade hoje. Ela é importante? Sim? Não?
Justifique
O papel da religião deve ser
restrito a isso, espiritualizar, discordo da religião interferir na política
por ideologias próprias e acho obsoleto a participação dela em pontos
estratégicos para que se mantenha a alienação do povo e que continuem
subtraindo dinheiro daqueles que menos tem para benefício próprio, cito com
isso as religiões que tem esse propósito. Vejo profissionais que levam suas
crenças para suas mesas de trabalho como juízes, psicólogos, médicos... esse
profissionais levam suas ideologias prejudicando outras pessoas com o intuito
de querer salvar ou ajudar, sendo que esse não é o papel deles, vão se
reconhecer fazendo algo útil, quando estiverem com suas mentes voltadas para a
sua melhora/correção e não se preocupando com a correção do outro.
Muitas das religiões possuem
ideologias exatas e não humanas, onde não existe uma possibilidade de
questionamento, respondendo as perguntas por que sim, e se você duvida, é
porque você vive em pecado. Meu Deus não é um ser punitivo, vingativo ou
castrador, e a energia que movimenta tudo em todos os espaços e inclusive me
fez da forma que eu sou hoje. Acredito mais na lei de ação e reação apontada
pelo Alan Kardec do que este Deus que passa castigando as pessoas pelo mundo.
As pessoas colhem o que plantam e a intervenção de Deus é mínima nesses
casos.
Se tivermos pessoas
"espiritualizadas", digo pessoas com pensamentos coesos e pelo bem de
toda uma sociedade sem exclusão, teremos essas pessoas atuando nas pontas como
no serviço social, educação, assistência, saúde, políticas, e aí sim, estaremos
em uma era de evolução e não mais de exploração.
No momento que o nosso pensamento, ideologia, ou ideia de sistema prejudica uma pessoa, ele já não é mais uma boa ideia e devem ser reformuladas.
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Nome completo: Gisele Ducav
Idade: 28 anos
Cidade: Concórdia-SC
Profissão / Ocupação: Médica-veterinária
Um lema de vida: Fazer sempre o bem, sem saber a quem!
1) Qual sua formação religiosa?
Posso dizer que meu avô paterno, que
faleceu quando eu tinha sete anos de idade, foi o responsável para uma formação
religiosa sólida e persistente. Foi ele quem me ensinou a rezar, a
frequentar a missa, o respeito para com Deus e sem perceber- também me ensinou
a devoção à Virgem Maria. Na cabeceira da cama dele, lembro-me que havia um
quadro com a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Por vezes, no meio da noite,
meu avô padecendo das dores de uma úlcera de estômago e do câncer, clamava para
que Ela o "levasse", para aliviar sua dor. Na adolescência, acabei me
afastando da religiosidade. Todavia, agora em vida adulta, ela volta com mais
fervor e estou mais consciente e madura quanto a necessidade da presença
constante de Deus em nossas vidas.
2) Sua concepção de Deus é...
Ser perfeitíssimo, criador do Céu e
da Terra, fonte de amor, justiça e humildade inesgotáveis.
3) Fale-me experiências (sejam positivas
e/ou negativas) que você teve com a religião.
Felizmente, não tive experiências
negativas pessoais com a pluralidade de religiões existentes. Porém ouço e vejo
muitos atos os quais não condeno- pois não sou Deus, mas desaprovo. A
intolerância religiosa, o extremismo, o charlatanismo são atitudes que fazem
mal ao próximo e por conseguinte, às nações. E há aqueles que sequer acreditam
em Deus. Sempre recorro às forças maiores, em situações de sossego ou em
momentos que necessito de ajuda. E não me canso de agradecer sempre- por tudo e
por todos, desde as coisas mais simples até as conquistas mais soberanas.
4) Faça uma análise da religião e seu papel
na sociedade hoje. Ela é importante? Sim? Não? Justifique
Acredito que a religião seja mais
importante para cada pessoa em si, do que para sociedade como um todo. Veem-se
ataques constantes entre religiões, fruto de pura ignorância. Deus é um só. Não
existe a mais certa ou errada, a melhor ou a pior. Pois, no final, tudo será
entre Deus e você, ninguém mais. O que eu, como um ser único criado por Deus,
independente da religião, fiz hoje de bom à Humanidade hoje?
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Nome: Fabrízia de Souza Felipe
Idade: 31
Cidade: Florianópolis-SC
Profissão/Ocupação: Acadêmica de Letras-Alemão da UFSC e
Diretora Financeira da ADEH (Associação de Direitos Humanos com enfoque na
sexualidade)
Um lema de Vida: Viver Intensamente, respeitando e sempre se
colocando no lugar do outro.
1) Qual sua formação religiosa?
Fui criada na católica, porem hoje
não sigo nenhuma religião.
2) Sua concepção de Deus é...
Acredito em Deus. mas não na Bíblia.
Acredito e sigo alguns ensinamentos como:
* perdoai-vos
uns aos outros;
* não
julgar o próximo;
* amar o
próximo.
3) Fale-me experiências (sejam positivas
e/ou negativas) que você teve com a religião.
Não sigo uma religião, não pela
religião, mas sim pelos representantes das religiões.
Alguns representantes, ao invés de
passarem coisas boas, disseminarem o amor, a fé, a união entre outras coisas, ficam
disseminando o contrário: o ódio, o que acham que é certo ou errado. Por esse
motivo fico desacreditada com as religiões.
4) Faça uma análise da religião e seu papel
na sociedade hoje. Ela é importante? Sim? Não? Justifique
Hoje o catolicismo tem um
representante que está sendo muito importante para esse momento em que estamos
vivendo. O Papa Francisco, além de sua sensibilidade, tem uma percepção, uma
visão diferenciada. acho que ele tem sido um excelente representante.
Adorei!!!
ResponderExcluirPassa o contato delas q lindas
ResponderExcluirCaro "anônimo". O meu blog tem um intuito reflexivo. Se queres algum site de relacionamento, sugiro que vá procurar em outro local.
ExcluirParabéns pela entrevista!
ResponderExcluirCaro Nahor, como sempre, amei sua matéria (esclarecedora e corajosa). Parabens!
ResponderExcluirAinda precisamos muito saber acolher o DIFERENTE. Será que temos "medo" por ignoracia ou preconceito?
Merci.
Parabéns pela iniciativa diferenciada, pois o que geralmente vemos é como a religião vê as pessoas trans. Já aqui na entrevista, vemos qual é o parecer delas quanto a visão de religiosidade.
ResponderExcluir:)
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